Assunção de Nossa Senhora – Vésperas

TODAS AS NAÇÕES cantam as vossas glórias, ó Maria! Hoje fostes exaltada acima dos Anjos e triunfais com Cristo para sempre1.

A primeira Leitura da Missa2, na Vigília da Solenidade da Assunção de Nossa Senhora, recorda-nos a passagem do Antigo Testamento que narra o traslado da Arca da Aliança para o seu lugar definitivo. Davi convocou todo o povo de Israel, ordenou aos sacerdotes que se purificassem para o traslado, chamou cantores e músicos para que a procissão tivesse o maior realce possível, e, num ambiente de enorme alegria, a Arca foi colocada no meio do Tabernáculo preparado para esse fim na cidade de Davi. Encontrou o seu repouso no monte Sião, que o próprio Deus escolhera para sua perpétua morada3.

A Arca era sinal da presença de Deus entre o seu Povo; no seu interior, guardava-se a sua Palavra, resumida nas Tábuas da Lei4. Menciona-se hoje esta passagem porque Maria é a Arca da Nova Aliança, em cujo seio o Filho de Deus, o Verbo, a Palavra de Deus feita carne, habitou durante nove meses5, e que, com a sua Assunção aos céus, encontrou a sua morada definitiva no seio da Santíssima Trindade. Ali, “levada no meio de aclamações de alegria e de louvor, foi conduzida até Deus, colocada num trono de glória, por cima de todos os santos e anjos do Céu”6.

A Arca do Antigo Testamento estava construída com materiais preciosos, revestida de ouro no seu interior; no caso de Maria, Deus cumulou-a de dons incomparáveis, e a sua beleza externa era o reflexo dessa plenitude de graças com que tinha sido adornada7. Correspondia assim à nova morada de Deus no mundo.

Não esqueçamos hoje que a Arca era para os judeus um lugar privilegiado onde Deus escutava as orações que lhe dirigiam: O meu nome estará ali, lê-se no livro dos Reis8. Maria, Arca da Nova Aliança, é também um lugar privilegiado onde Deus escuta as nossas súplicas, com a vantagem de que Ela soma a sua voz à nossa. Do céu, intercede e corrige as nossas súplicas quando não são totalmente acertadas: “Assunta aos céus […], continua a obter-nos os dons da salvação eterna”9, reafirma o Concílio Vaticano II.

“A nossa Mãe subiu em corpo e alma aos Céus. Repete-lhe que, como filhos, não queremos separar-nos dEla… Ela te escutará!”10 Mãe nossa, que estás em corpo e alma tão perto de Deus Pai, de Deus Filho, de Deus Espírito Santo, não nos largues da tua mão… Não me largues…, não os largues, minha Mãe. Que segurança nos dá em todos os momentos a devoção à Santíssima Virgem! Ela nos escutará em qualquer circunstância em que nos encontremos.

II. CONTA UMA ANTIGA TRADIÇÃO JUDAICA que, quando Jerusalém foi destruída pelos exércitos da Babilônia, o profeta Jeremias retirou a Arca e escondeu-a em algum lugar secreto. Desde então, não se voltou a ter nenhuma notícia dela. São João conta-nos que a viu no Céu, conforme relata uma das Leituras da Missa de amanhã, referindo-se claramente ao corpo de Maria Santíssima: Abriu-se no céu o templo de Deus e a Arca do seu Testamento foi vista no seu templo11.

“Ninguém pode dizer-nos com certeza quando e onde, nem de que maneira a Virgem deixou esta terra. Mas sabemos onde está. Quando Elias foi levado ao céu, os filhos dos profetas de Jericó perguntaram a Eliseu se podiam sair em sua busca. «É possível – disseram-lhe – que o espírito do Senhor o tenha transportado para o alto de uma colina ou o tenha deixado em alguma fenda dos vales». Eliseu consentiu a contragosto, e quando regressaram da sua busca infrutífera, recebeu-os com estas palavras: Não vos tinha dito eu que não fôsseis? (2 Rs 2, 16-18). O mesmo acontece com o corpo da Santíssima Virgem; em nenhum lugar da cristandade ouvireis nem sequer um rumor acerca dele. Há tantas igrejas em tantos lugares do mundo que afirmam com entusiasmo que possuem as relíquias deste ou daquele santo… Mas nunca de Nossa Senhora. E se algum de vós pensava ainda encontrar tão inestimável tesouro, o Santo Padre ordenou há algum tempo que se pusesse fim à busca. Sabemos onde está o seu corpo: no Céu”12.

Naturalmente, já sabíamos disso antes. No dia 1 de novembro de 1950, o Papa Pio XII definia como dogma de fé que “a Imaculada Mãe de Deus, sempre Virgem Maria, terminado o curso da sua vida terrena, foi assunta à glória celestial em corpo e alma”13. Mas, desde os começos da fé, os cristãos tiveram a convicção de que Santa Maria não experimentou a corrupção do sepulcro, mas foi levada em corpo e alma aos céus. Como escreve um antigo Padre de Igreja, “convinha que Aquela que guardara ilesa a virgindade no parto, conservasse o seu corpo imune de toda a corrupção mesmo depois da morte. Convinha que Aquela que trouxera no seu seio o Criador feito criança, fosse morar nos tabernáculos divinos […]. Convinha que Aquela que tinha visto o seu Filho na cruz e recebido no seu coração a dor de que estivera livre no parto, o contemplasse sentado à direita do Pai. Convinha que a Mãe de Deus possuísse tudo o que pertence ao seu Filho e fosse venerada por todas as criaturas como Mãe e Escrava de Deus”14.

A Assunção de Nossa Senhora cumula-nos de alegria e anima-nos a avançar com garbo por esse trecho do caminho que nos falta percorrer até chegarmos ao Céu. Dá-nos forças para alcançarmos a santidade a que fomos chamados por vocação. Mas é necessário que lutemos por ser bons filhos de Deus, “que procuremos manter a alma limpa, pela Confissão sacramental freqüente e pela recepção da Eucaristia. Desta maneira, também chegará para nós o momento de subirmos ao Céu. Não do mesmo modo que a Santíssima Virgem Maria, porque os nossos corpos conhecerão a corrupção do sepulcro, devida ao pecado. No entanto, se morrermos na graça de Deus, as nossas almas irão para o Céu, talvez passando antes pelo Purgatório, a fim de adquirirem a veste nupcial que é indispensável para podermos participar do banquete da vida eterna, a limpeza necessária para sermos dignos de ver a Deus sicuti est (1 Jo 3,2), tal como é. Depois, no momento da ressurreição universal, os nossos corpos ressuscitarão e unir-se-ão às nossas almas, glorificados, para receberem o prêmio eterno”15. E estaremos junto de Jesus e da sua Santíssima Mãe, com uma alegria sem fim.

III. OLHANDO ESSE FINAL FELIZ da vida da Virgem, compreendemos a alegria de sermos fiéis todos os dias. Percebemos que “vale a pena lutar, dizer ao Senhor que sim; vale a pena – no ambiente pagão em que vivemos, e em que por vocação divina temos de santificar-nos e santificar os outros –, vale a pena repelir com decisão tudo o que possa afastar-nos de Deus, e responder afirmativamente a tudo o que nos aproxime dEle. O Senhor ajudar-nos-á, pois não pede impossíveis. Se nos manda que sejamos santos, apesar das nossas inegáveis misérias e das dificuldades do ambiente, é porque nos concede a sua graça. Portanto, possumus (Mc 10, 39), podemos! Podemos ser santos, apesar das nossas misérias e pecados, porque Deus é bom e todo-poderoso, e porque temos por Mãe a própria Mãe de Deus, a quem Jesus não pode dizer «não».

“Vamos, pois, encher-nos de esperança, de confiança: apesar das nossas misérias, podemos ser santos se lutarmos um dia e outro, se purificarmos as nossas almas no Sacramento da penitência, se recebermos com freqüência o pão vivo descido dos céus (cfr. Jo 6, 41), o Corpo e o Sangue, a Alma e a Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, realmente presente na Eucaristia.

“E quando chegar o momento de rendermos a nossa alma a Deus, não teremos medo da morte. A morte será para nós o mesmo que mudar de casa. Virá quando Deus quiser, mas será uma libertação, o princípio da Vida com maiúscula. Vita mutatur, non tollitur (Prefácio I dos defuntos) […]. A vida não nos é arrebatada, mas transformada. Começaremos a viver de um modo novo, muito unidos à Santíssima Virgem, para adorar eternamente a Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, que é o prêmio que nos está reservado”16.

Enquanto não chega esse momento, a nossa Mãe ajuda-nos do Céu, todos os dias, em todas as nossas dificuldades. Não deixemos de recorrer a Ela, com a confiança dos filhos muito pequenos.

(1) Antífona de entrada da Missa vespertina; (2) cfr. Crôn 15, 3-4; 15-16; 16, 1-2; Primeira leiturada Missa do dia 14 de agosto; (3) Sl 131, 14; (4) Deut 10, 15; (5) cfr. C. Pozo, Maria en la Escritura y en la fe da la Iglesia, BAC, Madrid, 1985, pág. 160; (6) Santo Amadeu de Lausane, Oito homilias marianas, 7; (7) cfr. Paulo VI, Alocução, 17-V-1975; (8) 1 Rs 8, 29; (9) Conc. Vat. II, Const. Lumen gentium, 62; (10) Josemaría Escrivá, Sulco, n. 898; (11) Apoc 11, 119; Segunda leitura da Missa do dia 15 de agosto; (12) R. A. Knox, Tiempos y fiestas del año litúrgico, Rialp, Madrid, 1964, pág. 243; (13) Pio XII, Const. Apost. Munificentissimus Deus, 1-XI-1951; (14) São João Damasceno, Homilia II na dormição da Bem-aventurada Virgem Maria, 14; (15) A. del Portillo, Homilia no Santuário de Nossa Senhora dos Anjos de Torreciudad, 15-VIII-1989, em Romana, n. 9; (16) ib.

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