Festa do Batismo do Senhor

Neste domingo que se segue à solenidade da Epifania, a liturgia apresenta-nos o Batismo do Senhor no Jordão e introduz-nos na intimidade do mistério da sua Pessoa e da sua missão. Ao mesmo tempo, oferece-nos uma ocasião de agradecer os inumeráveis dons que Cristo nos concedeu no dia em que fomos batizados, e exorta-nos a reafirmar “com renovado ardor de fé os compromissos que um dia os nossos pais, padrinhos e madrinhas assumiram por nós com as promessas batismais” e a renovar “a nossa firme e ardente adesão a Cristo, bem como a vontade de lutar contra o mal” (João Paulo II).

Batizado Jesus, os céus abriram-se e o Espírito Santo pousou sobre ele em forma de pomba. E fez-se ouvir a voz do Pai: Este é o meu filho muito amado, o meu predileto.

Há poucos dias, celebrávamos a Epifania, a manifestação do Senhor aos gentios, representados naqueles homens sábios que chegaram a Jerusalém perguntando pelo rei dos judeus que acabava de nascer. Já antes tivera lugar a primeira revelação aos pastores, que, na noite do Natal, se dirigiram ao lugar onde o Menino havia nascido, levando-lhe presentes. A festa de hoje também é uma epifania, uma manifestação da divindade de Cristo demonstrada pela voz de Deus Pai, vinda do céu, e pela presença do Espírito Santo em forma de pomba, que significa a Paz e o Amor. Os Padres da Igreja costumam referir ainda uma terceira manifestação da divindade de Jesus: a que terá lugar em Caná da Galiléia, onde, com o seu primeiro milagre, Jesus manifestou a sua glória, e os seus discípulos creram nEle.

Na primeira Leitura da Missa, Isaías anuncia a figura do Messias: Eis o meu servo…, o meu eleito, em quem a minha alma se compraz. Sobre ele derramei o meu Espírito… Não quebrará a cana rachada nem apagará a mecha que ainda fumega… Eu, o Senhor, te chamei… para que abras os olhos aos cegos, libertes da prisão os cativos, e da masmorra os que jazem nas trevas. Esta descrição profética realiza-se plenamente no Batismo do Senhor. Naquele instante desceu sobre Ele o Espírito Santo em forma corpórea, como uma pomba, e ouviu-se uma voz que vinha do céu: Tu és o meu Filho amado, em ti ponho as minhas complacências. As três divinas Pessoas da Trindade intervêm nesta grande epifania nas margens do Jordão: o Pai faz ouvir a sua voz, dando testemunho do Filho, Jesus é batizado por João e o Espírito Santo desce visivelmente sobre Ele. A expressão de Isaías meu servo é substituída agora por meu Filho amado, que indica a Pessoa e a natureza divina de Cristo.

Com o Batismo de Jesus inicia-se de modo solene a sua missão salvadora. Ao mesmo tempo, o Espírito Santo começa por intermédio do Messias a sua ação nas almas, que durará até o fim dos tempos.

A liturgia própria deste domingo é especialmente apta para que evoquemos com alegria o nosso batismo e as suas consequências na nossa vida. Quando Santo Agostinho menciona nas suas Confissões o dia em que recebeu este sacramento, recorda-o com profunda alegria: “Naqueles dias, não me cansava de considerar com inefável doçura interior os profundos desígnios de Deus para salvar o gênero humano”. Com essa mesma alegria temos de recordar hoje que fomos batizados em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo.

O mistério do Batismo de Jesus faz-nos penetrar no mistério inefável de cada um de nós, pois da sua plenitude todos nós recebemos graça sobre graça. Fomos batizados não só por meio da água, como fazia o Precursor, mas no Espírito Santo, que nos comunica a vida de Deus. Demos hoje graças ao Senhor por aquele dia memorável em que fomos incorporados à vida de Cristo e destinados com Ele à vida eterna. Alegremo-nos por termos recebido o batismo talvez poucos dias depois de termos nascido, como é costume imemorial na Igreja, no caso de neófitos filhos de pais cristãos.

Fomos batizados em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, para entrar em comunhão com a Santíssima Trindade. De certo modo abriu-se o céu para cada um de nós, a fim de que entrássemos na casa de Deus e possuíssemos a filiação divina. “Se tiveres verdadeira piedade – ensina São Cirilo de Jerusalém -, também descerá sobre ti o Espírito Santo e ouvirás a voz do Pai do alto que diz: Este não é o meu Filho, mas, depois do batismo, foi feito meu”. A filiação divina foi um dos grandes dons que recebemos no dia em que fomos batizados. São Paulo fala-nos desta filiação e, dirigindo-se a cada batizado, não duvida em pronunciar estas felizes palavras: Já não és escravo, mas filho; e se filho, também herdeiro.

No rito deste sacramento, indica-se que a configuração com Cristo se opera mediante uma regeneração espiritual, como ensinava Jesus a Nicodemos: Quem não renascer da água e do Espírito Santo, não entrará no Reino de Deus. “O Batismo cristão é, com efeito, um mistério de morte e de ressurreição: a imersão na água batismal simboliza e atualiza a sepultura de Jesus na terra e a morte do homem velho, enquanto a emersão significa a ressurreição de Cristo e o nascimento do homem novo”. Este novo nascimento é o fundamento da filiação divina. E assim, por este sacramento, “os homens são enxertados no mistério pascal de Cristo: morrem com Ele, são sepultados com Ele, ressuscitam com Ele; recebem o espírito de adoção de filhos, pelo qual clamamos: Abba, Pai (Rm 8,15), e assim se tornam os verdadeiros adoradores que o Pai procura”.

Pelo Batismo, perdoa-se não só o pecado original como todos os pecados pessoais, e igualmente a pena eterna e temporal devida pelos pecados. O fato de sermos configurados com Cristo ressuscitado indica que a graça divina, as virtudes infusas e os dons do Espírito Santo tomam assento na alma do batizado, que se converte em morada da Santíssima Trindade. Abrem-se ao cristão as portas do Céu, e alegram-se os anjos e os santos.

Permanecem na natureza humana aquelas consequências do pecado original que, embora procedam dele, não são pecados em si mesmas, mas inclinam para o pecado; o homem batizado continua atreito à possibilidade de errar, sujeito à concupiscência e à morte, consequências todas elas do pecado original. No entanto, o Batismo semeia desde o começo no corpo humano a semente de uma renovação e de uma ressurreição gloriosas. Que enorme diferença entre a pessoa que vai ou é levada à igreja para receber este sacramento e a que regressa já batizada! O cristão “sai do batismo resplandecente como o sol e, o que é mais importante, convertido em filho de Deus e co-herdeiro com Cristo”.

Agradeçamos muito ao Senhor que tenha querido conceder-nos tanto bem, um bem que desejaríamos compreender hoje em toda a sua grandeza. Por fim, nós Vos pedimos…, ó Pai, a graça de ouvir fielmente o vosso Filho amado, para que possamos  chamar-nos e ser verdadeiramente vossos filhos. Este é o nosso maior desejo e a nossa maior aspiração.

Na segunda Leitura, São Pedro recorda aquele começo messiânico de Jesus, presente na mente de muitos dos que o escutavam e do qual alguns deles tinham sido testemunhas oculares. Vós sabeis – diz o Apóstolo – o que aconteceu em toda a Judeia, começando pela Galileia, depois do batismo pregado por João; isto é, como Deus ungiu Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com poder, e como Ele passou fazendo o bem e curando todos os oprimidos pelo demônio…

Pertransivit benefaciendo…, passou fazendo o bem. Este pode ser o resumo da vida de Cristo aqui na terra. Este deve ser o resumo da vida de cada batizado, pois toda a sua vida se desenvolve sob o influxo do Espírito Santo: quando trabalha, no descanso, quando sorri ou presta um dos inumeráveis serviços que a vida familiar ou profissional lhe pedem constantemente…

Na festa de hoje, somos convidados a tomar consciência uma vez mais dos compromissos adquiridos pelos nossos pais e padrinhos, em nosso nome, no dia do nosso batismo; a reafirmar a nossa fervente adesão a Cristo e a vontade de lutar por estar cada dia mais perto dEle; e a afastar-nos de todo o pecado, mesmo venial, já que, ao recebermos este sacramento, fomos chamados à santidade, a participar da própria vida divina.

É precisamente o Batismo que “nos faz “fideles” –  fiéis, palavra que, como aquela outra, “sancti” – santos -, os primeiros seguidores de Jesus empregavam para designar-se entre si, e que ainda hoje se usa: fala-se dos “fiéis” da Igreja”.

Seremos fiéis na medida em que a nossa vida – temos meditado nisto tantas vezes! – estiver edificada sobre o alicerce firme e seguro da oração. São Lucas diz-nos no seu Evangelho que Jesus, depois de ter sido batizado, estava em oração. E São Tomás de Aquino comenta: nesta oração, o Senhor nos ensina que “depois do Batismo, o homem necessita da oração assídua para conseguir a entrada no Céu; pois, se bem que pelo Batismo se perdoem os pecados, permanece, no entanto, a inclinação para o pecado que nos atormenta, interiormente, e permanecem também o demônio e a carne que nos combatem exteriormente”.

Além do agradecimento e da alegria por tantos bens que nos foram comunicados neste sacramento, renovemos hoje a nossa fidelidade a Cristo e à Igreja, uma fidelidade que, em muitas ocasiões, se traduzirá na fidelidade à nossa oração diária.

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