Memória de São Pio X, Papa

São Pio X nasceu na pequena cidade de Riese, no norte da Itália, no dia 2 de junho de 1835. Quando criança, conheceu as estreitezas de uma família simples de dez filhos; seu pai era o meirinho da aldeia. Distinguiu-se pelo seu contínuo serviço à Igreja e às almas como pároco, Patriarca Arcebispo de Veneza e Sumo Pontífice. Mostrou uma energia santa em defender a pureza da doutrina, revalorizou e dignificou a Sagrada Liturgia e difundiu a prática da comunhão freqüente. Adotou como lema do seu Pontificado: Instaurare omnia in Christo. Morreu no dia 20 de agosto de 1914.

I. O SENHOR FIRMOU COM ELE uma aliança de paz e designou-o como chefe do seu povo e sacerdote para sempre1.

Os anos do Pontificado de São Pio X foram particularmente atribulados devido às transformações internas de muitas nações, que tiveram sérias repercussões na vida dos fiéis cristãos. Contudo, o verdadeiro vendaval que assolou a Igreja no seu tempo foi de caráter ideológico e doutrinal: as tentativas de conciliar a fé com uma filosofia que estava muito longe dela nos seus princípios, desembocaram em numerosos erros muito difundidos. Essas ideologias atacavam os próprios fundamentos da doutrina católica e conduziam diretamente à sua negação2.

Na sua profunda preocupação por deter o curso desses males que de mil formas atingiam o povo fiel3, São Pio X tornou realidade o lema do seu Pontificado: instaurar todas as coisas em Cristo4. Insistiu com freqüência no mal que a ignorância causa à fé: “É inútil esperar – costumava dizer – que quem não tem formação possa cumprir os seus deveres de cristão”. Exortava constantemente a ensinar o Catecismo.

Dessa sua solicitude pela formação dos cristãos surgiu o chamado Catecismo de São Pio X, que tanto bem fez à Igreja. Todo o seu Magistério refletiu a sua ânsia de dar doutrina a um mundo que estava faminto e necessitado dela. E ele próprio, já sendo Papa, não quis abandonar os meios tradicionais de catequese. Até 1911, costumava ensinar o Catecismo no Cortile de São Dâmaso e em outros locais do Vaticano. Todos os domingos convidava os fiéis de uma paróquia romana a assistir à Missa que lhes celebrava e em que lhes explicava o Evangelho.

Uma boa parte dos erros que São Pio X combateu parecem ter adquirido foros de cidadania nos nossos dias. E em países evangelizados há quase vinte séculos, são muitos os que desconhecem as verdades mais elementares da fé e se encontram indefesos, deixando-se arrastar por esses erros, com a cumplicidade das suas próprias paixões5. Os apelos que São Pio X fez no seu tempo, alertando para a necessidade de conservar e difundir a boa doutrina, continuam a ser plenamente atuais. É especialmente urgente que todos os cristãos, por todos os meios ao seu alcance, dêem a conhecer os ensinamentos da Igreja sobre o sentido da vida, o fim do homem e o seu destino eterno, o matrimônio, a generosidade no número de filhos, o direito e dever dos pais de escolherem a formação que os seus filhos devem receber, a doutrina social da Igreja, o amor ao Papa e aos seus ensinamentos… Lembremo-nos de que é preciso pôr remédio à mentalidade laicista que nos envolve, à livre opinião em matéria moral que, virando as costas aos preceitos divinos, acaba por minar as próprias bases da convivência social e por destruir a dignidade humana. É grande a sementeira de bem que temos de espalhar à nossa volta. E assim nós mesmos nos robusteceremos. Como recordou o Papa João Paulo II, “a fé se fortalece dando-a!”6

II. SÃO PIO X DISTINGUIU-SE pela grande firmeza com que enfrentou um ambiente freqüentemente adverso; ao mesmo tempo, era muito humilde e simples. A primeira Leitura da Missa7 traz-nos umas palavras de São Paulo aos tessalonicenses que bem podiam ter sido escritas pelo Santo Pontífice: Tendo sofrido e tolerado afrontas, tivemos confiança no nosso Deus para vos pregar o Evangelho de Deus no meio de uma forte oposição. No entanto, São Pio X – como São Paulo – manteve-se sereno e alegre no meio das dificuldades, porque a sua vida estava fortemente enraizada na oração.

Também não lhe faltou bom humor. Um soldado da guarda suíça lembra-se de que certa vez lhe coube montar guarda à noite num pátio debaixo da janela do quarto de dormir do Papa. Com a alabarda ao ombro, o soldado caminhava de um lado para o outro. Seus passos ressoavam nas lousas. A certa altura da noite, abriu-se a janela e apareceu a figura do Papa: “Bom homem, que faz aí?” O soldado explicou a sua tarefa como pôde. E São Pio X, benevolente, recomendou-lhe: “Vá descansar, que será melhor. Assim poderemos dormir você e eu”8.

São Pio X teve fama de fazer milagres em vida. Certo dia, os seus antigos paroquianos foram visitá-lo. E com a simplicidade e confiança que sempre tinham tido com ele – e também com total falta de tato –, perguntaram-lhe: “Dom Beppo (assim o chamavam quando era pároco), é verdade que o senhor faz milagres?” E o Papa, com simplicidade e bom humor, respondeu-lhes: “Vejam…, aqui no Vaticano, é preciso fazer um pouco de tudo”9. Mas um bispo brasileiro, tendo ouvido falar da fama de santidade do Pontífice, viajou a Roma nos primeiros meses de 1914 para implorar do Santo a cura de sua mãe, que tinha sido atacada de lepra. Ante a sua insistência, o Papa exortou-o a pedir a cura a Nossa Senhora e a algum outro santo. Mas o bispo insistiu: “Ao menos, digne-se repetir as palavras de Nosso Senhor ao leproso: Volo, mundare!(quero, fica limpo). E o Papa, com um sorriso condescendente, repetiu: Volo, mundare! Quando o bispo regressou à sua pátria, encontrou a sua mãe curada da lepra”10.

Entre as graves responsabilidades e a dureza de tantos acontecimentos que São Pio X teve de enfrentar, o Senhor concedeu-lhe a graça de não perder a simplicidade e o bom humor. São duas virtudes humanas que nós que tomamos a sério a nossa fé, vivida no meio do mundo, podemos pedir hoje ao Senhor por intercessão desse Santo Pontífice. Ajudar-nos-ão a sentir-nos filhos de Deus, a estar serenos e alegres perante qualquer dificuldade.

III. SÃO PIO X AMOU e serviu a Igreja com suma fidelidade. Desde o começo do seu Pontificado, empreendeu uma série de profundas reformas. De modo particular, dedicou especial atenção aos sacerdotes, de quem esperava tudo. Da santidade deles – disse muitas vezes e de diversas maneiras – dependia em grande medida a santidade do povo cristão. No cinqüentenário da sua ordenação sacerdotal, dedicou aos sacerdotes uma exortação11 que tinha por subtítulo: Sobre como devem ser os sacerdotes de que a Igreja precisa. Pedia, sobretudo, sacerdotes santos, inteiramente dedicados ao seu trabalho de almas.

Muitos dos problemas, necessidades e circunstâncias dos onze anos de pontificado de Pio X continuam a ser atuais. Por isso, hoje pode ser uma boa ocasião para examinarmos como é o nosso amor com obras à Igreja; se, no meio dos nossos afazeres temporais, cada um de nós tem “uma viva consciência de ser um membro da Igreja, a quem foi confiada uma tarefa original, insubstituível e intransmissível, que deve levar a cabo para o bem de todos”12: dar boa doutrina, aproveitando as ocasiões ou criando-as; ajudar os outros a encontrarem o caminho da sua reconciliação com Deus por meio da confissão sacramental; pedir diariamente e oferecer horas de trabalho bem acabado pela santidade dos sacerdotes; contribuir generosamente para a sustentação da Igreja e das obras de caridade; servir de eco ao Magistério do Papa, principalmente em assuntos relativos à justiça social, à moralidade pública, ao ensino, à família… “Que alegria poder dizer com todas as forças da minha alma: – Amo a minha Mãe, a santa Igreja”13. Um amor que se traduz todos os dias em obras concretas.

Examinemos também como é o nosso amor filial ao Papa, que para todos os cristãos deve ser “uma formosa paixão, porque nele vemos Cristo”14. Meditemos hoje se rezamos todos os dias pela pessoa do Sumo Pontífice, para que o Senhor o guarde e o vivifique e o faça feliz na terra…

Ó Deus – pedimos com a coleta da Missa de hoje –, que para defender a fé católica e instaurar todas as coisas em Cristo, cumulastes o Papa São Pio X de sabedoria divina e coragem apostólica, concedei-nos que, dóceis às suas instruções e exemplos, alcancemos o prêmio eterno.

(1) cfr. Eclo 45, 30; Antífona de entrada da Missa do dia 21 de agosto; (2) cfr. R. Garcia de Haro, História teológica do modernismo, EUNSA, Pamplona, 1972; (3) São Pio X, Decr. Lamentabili, 3-VII-1907; Enc. Pascendi, 8-IX-1907; (4) São Pio X, Carta Apost. Bene nostis, 14-II-1905; (5) cfr. João Paulo II, Exort. Apost. Christifideles laici, 30-XII-1988, 34; (6) idem, Enc. Redemptoris missio, 7-XII-1990, 2; (7) 1 Tess 2, 2-8; (8) cfr. J. M. Javierre, Pio X, 5ª ed., Juan Flors, Barcelona, 1961, pág. 180; (9) cfr. L. Ferrari, Pio X: Dalle mie memorie, Vicenza, 1922, pág. 1528; (10) G. Dal-Gal, Pio X, el Papa Santo, Palabra, Madrid, 1988, pág. 304; (11) São Pio X, Enc. Haerent animo, 4-VIII-1908; (12) João Paulo II, Enc. Christifideles Laici, cit., 28; (13) Josemaría Escrivá, Caminho, n. 518; (14) Josemaría Escrivá, Amar a Igreja, Prumo-Rei dos Livros, Lisboa, 1990, pág. 36.

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